sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Sobre feiras, livros e garotas

Bem, o tempo é uma ilusão e sua contagem é algo deprimente. Só marcamos e contamos o tempo para tentar dar algum brilho àquela coisa insignificante que chamamos de vida, e somos tão obtusos que não temos capacidade de ver o engano que estamos submetendo a nós mesmos. Claro que existem certas aplicações interessantes dessa contagem, desde os tempos remotos de quando plantávamos batatas, ao invés de comprá-las prontas no supermercado. Naquela época, era bastante necessário saber a data mais acertada para fazer com que as batatas crescessem fortes e felizes nos alimentando e nos deixando mais fortes e felizes que elas. Mais tarde, na Segunda Onda (a industrialização), foi bom marcar o tempo para que pudéssemos chegar no horário certo aos compromissos certos, sem falar em fazer com que todos os babacas analfabetos do proletariado trabalhassem a mesma quantidade de horas.
Mas, no fim, o tempo não existe. O que achamos que é o tempo é na verdade uma peça pregada pelas reações químicas no nosso cérebro, como todo o resto. Então, botem fogo nas funções horárias que o professor de Física lhes enfia goela abaixo e esqueçam o fato de que eu demorei uma semana inteira para vencer a preguiça e escrever o post sobre a Feira do Livro da Nilo Peçanha.

Well, povo e pova, todo mundo sabe que eu participei de uma feira do livro na semana passada. Quem não sabe é só ler o post anterior que acaba ficando sabendo. E para quem não sabe, mas acha que sabe e por isso não vai ler o post anterior, eu vou explicar a história desde o início.
No início era o Caos. Veio Deus e blá blá blá...
...até que o Frodo, grande amigo meu, convidou o Antônio, outro grande amigo meu, a participar de uma antologia de Ficção Científica, e num processo de indicações e aceitações de sugestão o Frodo também me convidou.
Eu escrevi um conto então, mandei e fui aprovado (não sem antes aceitar sugestões de mudança em certas partes do texto). Quando dei por mim estava com os exemplares em mãos para vender. Vendi para os amigos, para os amigos dos amigos, e minha mãe vendeu para as clientes dela.
Minha mãe é sócia de um Salão de Beleza, e babona do jeito que ela é, logo todas as clientes dela sabiam do meu livro. A notícia espalhou-se praticamente como a gripe suína. Não, perdão, espalhou exatamente como a gripe suína.
Uma das infectadas pela idéia foi a Profª Lara, agora uma grande amiga minha, que depois de ler o conto, começou a conversar comigo sobre a possibilidade de eu ir na feira do livro da escola onde ela trabalha para conversar com os alunos de lá sobre leitura, escrita e sobre o conto que eu publiquei.
Aceitei, claro. Ela, junto com a Profª Simoni, apresentaram o conto para alunos de 5° e 6° anos, e foi com eles que eu conversei.

No dia do bate-papo eu estava super nervoso. Imagina? Falar sobre livros com alunos em uma escola do Brasil? Só podia ser furada. Engoli a desconfiança e intimei a Lara a ficar do meu lado para eventualmente segurar a minha mão e dar um apoio moral (risos). Na hora, com o pessoal ao meu redor fazendo perguntas, eu nem lembrava mais do nervosismo; ele tinha ido parar lá atrás do cérebro, junto com os Sentimentos Esquecidos, se escondendo embaixo dos Sentimentos Que Não Te Abandonam Embora Tu Queira Muito Que Eles O Façam.
As perguntas variaram bastante; foram desde “de onde vem a tua inspiração” até “pra qual time tu torce?”, e me surpreendi respondendo a elas como se estivesse acostumado a fazê-lo há muito tempo. Nem gaguejei! Cheguei até a passar pra eles um discursinho sobre os benefícios da leitura e o porquê de ser perda de tempo não gostar de ler.
Depois do bate-papo, de manhã e de tarde houve também sessão de autógrafos. Sim, caro leitor, não leste errado, “sessão de autógrafos”. Quando vi que tinha gente pedindo autógrafos pra mim como se eu fosse um Stephen King da vida, acho que meu ego não agüentou; foi demais para ele. Quando recobrou a respiração e os batimentos cardíacos, explodiu em um salto magnífico, que faria a Daiane dos Santos babar. Pelo que eu soube, no momento ele está orbitando um sistema estelar binário em algum lugar da Borda Oriental da Galáxia, e vai demorar a voltar.
Foi uma experiência incrível. Muito incrível mesmo. Para mim, que nunca tinha feito isso antes, e para os alunos, que não conheciam um escritor que usasse All Star.

Meus sinceros agradecimentos a todos os que contribuíram para que isso acontecesse, mesmo!

Um abraço bem forte em todos vocês!

PS: uma nota sobre garotas, para fazer sentido o título do post: dê um pouco de fama, ou melhor, dê um pouco de destaque para um garoto, que na hora, imediatamente, o nível de sex appeal dele cresce exponencialmente, independente dos demais fatores de atração. Eu e os cantores emocore que o digam!
PPS: pessoal da Nilo: se fizerem alguma pergunta, deixem um e-mail de contato para que eu possa responder, ok? Ou conversem comigo direto em Marcus423@gmail.com

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Post Quase Cultural

Há muito tempo que não comento livros aqui nesse espaço, e não vai ser hoje que eu vou comentar, é claro. Preguiça de elaborar uma resenha que seja legal, e se eu fizer com preguiça, não fica bom. Certas coisas só devem ser feitas se forem bem-feitas, e isso (hoje) é uma delas.
Então, descartada a possibilidade de eu comentar livros aqui, é provável que mais pessoas cheguem ao fim deste texto, e não desistam na metade ou antes. Não os leitores de sempre; esses, eu sei, lêem os meus textos até o fim. Se por que gostam do texto ou por que gostam de mim, já é uma questão metafísica demais para o momento.
Em lugar de resenhas, então, vou falar de literatura, pelo menos a parte da literatura que também faz parte da minha vida, então o que tiver daqui pra diante no post é a intersecção entre a literatura e o meu Eu de Hoje, filtrada pela minha (e de todos nós) incapacidade de descrever perfeitamente determinados fatos e circunstâncias. As idéias e a percepção de cada um são muito difíceis de serem expressadas, por manterem uma distância respeitável das mentes das outras pessoas*. O objetivo de todo escritor (alguns querem é ganhar dinheiro, mas os demais) é melhorar o modo como se traduzem idéias em códigos que as outras mentes, digo, pessoas possam entender, mesmo que tal entendimento não seja também tão fácil**, como vejo que o será esse parágrafo.
Mas enfim.

Comecei a escrever em um diário. Como o nome sugere, eu o faço todos os dias. Quando falho em um, no próximo eu duplico o tamanho, não por punição, mas por natureza. A abstinência me entusiasma sobremaneira e quando vejo lá se foram quatro páginas de caderno.
A idéia inicial de fazer o diário eu não sei. Os objetivos são vagos, e para cada pessoa eu teria uma resposta diferente. Por exemplo, se o Amigo Dos Desabafos me perguntar, eu digo que é por que assim eu vejo meus problemas por outro ângulo, e facilito uma possível resolução e amadurecimento.
Pro Amigo Neurocientista, eu digo que é para melhorar a memória (paradoxalmente, ao deixar registrado o que eu fiz, fica mais fácil de eu não precisar consultar os registros...). Pro Amigo Prático, eu digo que é apenas uma forma de melhorar a escrita, e o faço escrevendo um diário por causa do motivo que eu diria para o Amigo Loucão.
Pro Amigo Loucão, eu digo que é por que eu sinto uma necessidade grande às vezes de deixar escorrer as idéias que eu tenho na cabeça para o papel, passando pela escrita. Simplesmente minha cabeça não cala a boca, me deixa hiperativo, meio na lua e, em casos extremos, com insônia. Por essas idéias uivantes serem ou idiotas ou complexas demais (ou ambas), eu não sinto vontade de postá-las no blog. Como grande parte das idéias que eu tenho são desse ou daquele grupo, fica difícil eu conviver comigo mesmo sem deixar isso em algum lugar.
Todos os motivos são reais. E a idéia de que pouca gente entenderia se eu explicasse tudo, achando estranho que eu tenha mais de um motivo para fazer algo, é o tipo de coisa que eu deixo pra escrever no diário. Isso e * e **.

Outra parte da intersecção de que falei no início, é uma mais literária mesmo. Semana que vem eu participarei de uma feira do livro aqui na minha cidade, graças a minha participação na Antologia Solarium, sobre a qual eu falei em um passado remoto. Eu vou conversar lá com turmas de 5° e 6° ano sobre leitura e sobre escrita. Quando me perguntaram se eu topava participar eu pensei “Se eu gostaria de participar de uma feira do livro, onde eu vou falar sobre duas das coisas que eu mais sou apaixonado? Por acaso macacos gostam de bananas?”. Aceitei, claro, hehehe.
As turmas que eu falei também lerão o meu conto, e parte da conversa será sobre ele. Estou muitíssimo entusiasmado, e acho que será bastante válida a experiência. Depois de ocorrido a dita feira, eu conto como foi.

Um último ponto importante na intersecção (bem no meio da intersecção: o ego). Recentemente eu recebi o que geralmente se chama de elogio pelo blog. Mas eu diria mais, foi praticamente uma declaração de amor incondicional (exageropontocom), hehehe. Eu gostaria de dizer que se o prazer que as pessoas tem em me ler for metade daquele que eu tenho em escrever pra elas, essas pessoas já tem o equivalente moral de um orgasmo, ;)

Um abraço forte!

domingo, 23 de agosto de 2009

Renegando ao Movimento Sedentário

Pois é, caríssimos, a vida está sempre nos provando que idéias que antes tínhamos não são tão boas como achávamos, e que idéias que não tínhamos seriam bem prazerosas de serem tentadas. Novidades são interessantes, e há quem diga que viver é isso mesmo: se tocar de cabeça nas oportunidades, arriscar o que puder, ao mesmo tempo que se mantem a cabeça fixa em cima do pescoço e o pescoço preso ao resto do corpo.

O que quer dizer, em outras palavras, que a vida é um troço mutcho loco.

E é mesmo. Dia desses, minha turma viu uma palestra sobre Kung Fu (a filosofia chinesa) e o Wu Shu (a arte marcial da filosofia chinesa do Kung Fu). Aqui no ocidente ambos conceitos não são lá muito diferenciados, pra nós é tudo um monte de gritos e kame-hame-has.
Posso dizer que adorei a palestra, mesmo. Fiquei todo pilhado para passar a praticar Kung Fu, e até pesquisei alguns preços em algumas academias do centro da cidade. Todos, é claro, estavam fora do orçamento. Por isso tive que mandar pra minha escola um cadastro que, entre outras coisas, os informa de que eu estaria interessado em fazer estágio para ganhar algum dinheiro caso eles estivessem interessados em meus serviços.
Como não me chamaram, fiquei sem ir no Kung Fu.

Paralelo a isso, eu estava ficando cada vez mais consciente da saúde e coisa e tal, a baboseira toda que vocês estão sonolentos de saber. E então, só para ajudar, uma amiga, durante uma conversa em que falávamos sobre artes marciais, comentou sobre as pernas de quem faz Muay Thai, que são, nas palavras dela, “nossa...!”.
Me choquei com aquilo. Guardei para mim, mas aquilo foi uma dessas informações que não se contentam em entrar na cabeça, elas entram, quicam lá dentro, e ficam fazendo acrobacias o tempo todo para serem relembradas.
E é por isso que, na última quarta-feira, entrei para uma academia daqui de perto de casa. Não é Muay Thai, mas é o mais próximo que eu consigo chegar disso. Também não está bem dentro do orçamento, mas é bem mais barato e consegui uma amiga da minha mãe que precisa de aulas particulares de matemática e, oh!, descobri que dando aula pra ela eu posso pagar a academia e minha mãe não precisa nem se coçar.

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Lá conheci bastante gente. A secretária é super gente fina, lê alguns livros que eu já li, e sempre sorrindo de bem com a vida.
Um outro cara que faz nos mesmos horários que eu é, também, muito legal, conta histórias legais e está sempre me ajudando a decifrar as instruções dos treinos.
Tem também, claro, um Negrão, com N maiúsculo, de “Nossa senhora que cara grande”, cujos bíceps tem bíceps que tem bíceps, e que tem, entre seus antepassados, um armário e uma parede. Mas, apesar do tamanho e de falar três tons acima do limite inferior da audição humana, ele é super legal e prestativo.
Em alguns momentos também tem os maloqueiros do morro, levantando pesos consideráveis e ostentando músculos anabolizados, mas com esses eu não conversei muito.
Todo mundo de lá parece ser legal (exceto os maloqueiros) e realmente estou me sentindo muito bem de ir lá. Talvez seja psicológico, mas estou feliz que meu cérebro consiga me enganar tão bem.

E não se preocupem, eu pesquisei na internet e, desde que eu não pegue pesado, o meu crescimento longitudinal não será afetado. Pelo menos até os 21 anos, eu ainda quero crescer um pouco.

Recomendo o hábito de ir na academia para quem puder, porque apesar das dores, compensa bastante!

Abraço!

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Pé de Valsa

Este final de semana foi emblemático, e entrou para a minha lista pessoal de melhores finais de semana do mundo.
Primeiro, durante a semana, recebi o convite, bastante improvável aliás, de ir no Baile da Linguiça. Como todos vocês sabem, sábado foi o dia da linguiça, ou se não sabiam, agora sabem. Em todos os lugares de cultura majoritariamente germânica, como é o caso da minha adorada Capital Nacional do Calçado, o cardápio de sábado foi um só: linguiça. Assada, frita ou crua, o que importava era que fosse linguiça.
E, como é de tradição aqui no bairro, a igreja católica promoveu um baile em comemoração ao dia da dita cuja, que eu só não repito o nome pra não gastar a palavra. A entrada foi cara, como também é de tradição, mas valeu cada centavo. E olha que eu sou migalheiro em relação a dinheiro, mais ainda em tempos de crise do dólar, essas coisas.
Já lá dentro, conversei com algumas pessoas, evitei de conversar com outras, sabem como é. Como era de se esperar de um baile organizado pela igreja, com o agravante de ser da cultura alemã, o grosso do pessoal que estava lá era de jovens sexagenários, septuagenários e octogenários. As pessoas mais novas eram filhas ou netas das papa hóstias e do puxa-sacos do padre. Mas isso não chegou a me abaixar o entusiasmo pelo baile, estava louco para fazer alguma coisa no que eu achava que seria a última semana de férias (ouvi boatos de que existem boatos sobre aumentar ainda mais o recesso escolar de inverno por causa da gripe A) e não seria um ou outro tendo um ataque cardíaco que ia abalar isso.
Na hora da janta, eu estava azul de fome. Tivemos que esperar um monte de gente ir se servir antes de nós, por que ainda estávamos esperando os parentes da minha prima e, principalmente, por que não queríamos ser soterrados pela avalanche de pessoas famintas que se tocaram no Buffet. Na devida hora, nos servimos e, meu chapéu, como a comida estava boa. Eu sou bem chato pra comer, mas aquela comida, apesar de ser linguiça, estava boa, com ou sem trema.
Tempo suficiente depois, um cara foi no palco improvisado e sorteou uma (adivinhem?) linguiça de meio metro, e em seguida uma de um metro e meio. É linguiça pra caramba, passarão semanas antes que os sorteados estejam novamente com o hálito em dia.
Então começou o baile. A banda estava boa, e acabou de vez com o preconceito que eu tinha com bandinhas alemãs, por que tocavam bem mesmo.
E é aí que começa a parte boa mesmo do fim de semana. Fui dançar com a minha prima, dancei umas duas músicas com ela, sentei. Cinco segundos depois a mãe da minha prima me tira pra dançar. Dancei duas ou três músicas com ela, e sentei. Cinco segundos depois, a irmã da mãe da minha prima me tira pra dançar e eu danço umas duas músicas com ela, e sento. Nisso, minha prima me tira pra dançar uma valsa, por que ela queria mostrar para o namorado dela como era. Dancei, e então sentei. A sobrinha da mãe da minha prima veio e me tirou para dançar, por que o marido dela não sabia e não estava no humor para aprender. Pois bem, eu fui, dancei umas duas músicas e sentei de novo. E depois fui dançar, e fui nesse ritmo até o intervalo do baile, quando o pessoal começou a cansar.
Eu, é claro, estava um pouco cansado também, mas estava feliz demais para notar na ocasião. A dança é a linguagem da alma, e a minha alma tinha bastante coisas para falar.
Depois do intervalo e da parte retrô do baile, quando a banda tocou sucessos de antigamente, aconteceu algo que deixaria qualquer um puto, menos a mim, que achei normal. Eu estava lá dançando animado, em um ritmo acelerado, quando a perna da minha parceira de dança, não sei como, nem de que jeito, parou em uma posição tal que impediu a minha própria perna de fazer o movimento de retorno, o que resultou que eu, 15 anos, 1,70m de altura, pesando 65kg, olhos azul-esverdeados, corpo atlético e pinta de galã caí com tudo na tal perna da parceira. Eu não achei ruim, nem ela, creio, mas certamente os espectadores acharam divertidíssimo. Foi a última música que ela dançou comigo, não sei por que.

Quando acabou o baile, escutei uma coisa que elevou minha auto-estima a níveis alarmantes e fez o meu ego dar um salto à lua e permanecer lá até agora: “Quem salvou a noite foi o Vini!”. Vini, no caso, sou eu. E é importante ressaltar que isso tem um valor do caramba para mim que, no fundo, tenho complexo de inferioridade. Não me senti o macho alfa do grupo (risos), mas senti como se eu fosse importante, e eu nem lembrava como era isso. Passei por vários momentos, nos últimos tempos, em que eu me considerei um lixo, e relembrar que na verdade eu não valho tão pouco foi bom. Pra dizer o mínimo.
Voltei para casa, ainda levitando, e tomei um banho. Quando o corpo começou a esfriar que eu notei as dores da guerra: minhas pernas e pés estavam em frangalhos, minha bunda (que, por algum motivo inextricável, é a parte do corpo que fica mais tensa quando eu danço) ainda estava dura, etc. Mas quanto a essas eu estava vingado antecipadamente: sei de cinco ou seis calcanhares que eu pisei que nunca mais serão os mesmos.

Por isso, pessoal, respeitem a linguiça(?)!

Abraço!

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Não é a Morte da Bezerra

O temor da morte é um dos mais antigos, e de certo modo é algo que movimenta o mundo desde sempre. Isso e a vontade de fazer sexo, mas não vem ao caso exatamente.
Medo de morrer e medo de que morra algum ente querido, ou algum querido que não seja ente(!?), nos privando de sua companhia e nos desesperando com o fato de que vê-lo novamente só em lembranças. Porém a dor da perda é superável, mas a morte não, e é por isso que eu temo a minha própria morte mais do que a morte das pessoas a minha volta: se eles morrerem, a dor vai ser grande, enorme em alguns casos, mas passa e momentos alegres voltarão; já se eu morro, não tem choro nem vela, já era. Na minha visão, é preferível uma situação de dor absurda, mas com esperança de felicidade do que uma situação de total falta de expectativa (de tristeza ou felicidade).
No caso improvável de que eu morra, sei que o mundo continua mesmo sem a minha presença. Digo improvável por que existem seis bilhões de pessoas lá fora para morrer, então por que isso aconteceria logo comigo? Pois é.

Existem pessoas que não querem morrer queimadas ou afogadas, devido o alto sofrimento envolvido no processo. Algumas gostariam de morrer dormindo, ou anestesiadas pra caramba. Eu, por outro lado, não gostaria de morrer. De fato, pretendo viver para sempre; mas como os fatos não dependem de pretensões, sei que não vai acontecer como quero. Talvez objetivando tão inalcançável objetivo eu chegue mais longe do que se pretendesse algo não absurdo, mas isso também já é questão para debate de filosofia, e não para este post deliberadamente mórbido. Viver para sempre, então, talvez não seja possível. E também não é tão certo que isso seria legal, já que em termos de tempo, eu só vivi 15 anos. Para o mundo, “todo o tempo do mundo” é a eternidade, mas para mim isso por enquanto dura 15 anos. Essa defasagem de perspectivas certamente leva a julgamentos errados. Concluindo essa idéia, viver na eternidade mesmo que possível, talvez não seja uma boa idéia. Vai saber.
Deixada de lado então a imortalidade, e visto que uma vida que acaba tem um fim (por definição, algo “que acaba”, é por que tem um fim, Ana Maria Braga!), se eu pudesse escolher como eu esticaria as pernas eu escolheria fazê-lo fazendo algo que eu goste. Ou que eu goste na época que tal coisa acontecer. Lendo, caminhando, sentado pensando... Simplesmente do nada meu coração parar e eu fechar os olhos como se fosse tirar mais uma soneca. Afinal, “o sono é uma morte incompleta; a morte é o sono perfeito”.
Em outras palavras, uma morte tranqüila, de causas naturais. Da mesma forma que todo mundo morreria se não existissem as armas e o fast-food.
A época da morte é ainda mais difícil de escolher. Contanto que demore bastante, a morte seria bem vinda apenas depois do momento que eu já não sou independente para viver. Minha cabeça acho que vai ser boa até a hora da morte, então talvez eu vou estar apenas com o hardware avariado. Concluo então que não existe conclusão para isso. Estar lúcido é o suficiente para ser feliz? Cabe a cada um responder, eu acho.

Comigo já morto, não sei se faz algum sentido eu dizer como gostaria que fosse o meu enterro. A minha atual crença (ou mais apropriadamente “falta de”) é uma visão material e racional da vida, segundo o qual a vida acaba quando as funções cerebrais acabam. Nenhuma alma ou espírito para supervisionar o que os meus amigos e parentes fariam com o meu corpo defunto.
Mas, ora bolas, se as coisas fizessem sentido em tempo integral a vida seria uma sucessão de chatices previsíveis. Como não é o caso, então o que na verdade não faz sentido é eu deixar de dizer como eu gostaria que fosse o meu enterro só por que tal emissão de opinião não vai na prática me dizer respeito. Então lá vai.
Fugindo do lugar-comum de dizer que eu quero um enterro feliz, com música e dança, eu quero um enterro onde todos estejam chorando a cântaros por minha partida. Me reservo o direito a esse egoísmo último. Quero morrer amado e admirado, e quero que as pessoas expressem isso. De preferência em vida, mas se não for possível que o façam no meu velório.
Na parte religiosa, não faço questão que tenha um padre ou pastor abençoando o meu “invólucro sagrado” vazio. O que vai acontecer é que meus parentes vão acabar chamando um, e se isso os confortarem, tanto melhor. Todos nós temos direito a essa irracionalidade em um momento difícil como o que descrevo. Eu, pessoalmente, penso seriamente em pedir apostasia da igreja, se isso não me custar dinheiro ou um preconceito muito forte. Se eu estiver errado, me entendo com o Monstro do Espaguete Voador depois. A possibilidade de que tudo o que sabemos está errado é sempre uma possibilidade; não trabalhar com essa idéia é demonstrar ignorância tanto quanto quem nem quer saber das outras possibilidades.
De qualquer modo, eu também pretendo (por todo o tempo que pretendo viver) ser uma pessoa boa, e isso, espero, talvez me redima do pecado de acreditar no que atualmente me parece mais acreditável.

A morte é um tema bastante difícil de esgotar. Mas não é de todo triste, pois faz parte da vida e nos impulsiona no sentido de continuar vivendo cada dia como se ele fosse o último. E esse é o nosso objetivo, não?

Abraço!