segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O fim e o recomeço


A página em branco sempre me dá um certo pânico, um friozinho na barriga e uma momentânea falta de léxico que só vai embora quando eu finalmente paro de pensar no que escrever e começo a escrever de fato. Deixado esse momento incômodo de lado, o resto flui quase naturalmente.

***

O fim seduz a mente, porque a mente não consegue entender a própria inexistência. E em tempos de fim do mundo, de Corinthians ganhando Mundial (e de eu usando futebol como exemplo no blog; isso sim é o fim!), o fim me bota a pensar.

***

Todo mundo sabe que pode morrer a qualquer momento. De certa forma, é isso que empresta à vida toda a sua magia, essa sua incerteza e urgência. Estamos perfeitamente cientes de que na próxima esquina poderemos virar mingau embaixo de um ônibus descontrolado, ou podemos estar bons em uma semana e na seguinte cairmos numa cama de hospital e dali pro buraco... Qualquer momento pode ser o último, e nunca sabemos quando é o último momento.
Mas, ainda assim, somos otimistas e na maior parte do tempo vivemos como se fôssemos continuar vivendo para sempre. Mas não vivemos para sempre, é claro. Todo ser humano é mortal, e assim como Sócrates, eu e você somos humanos.
Completei há algumas semanas 19 anos. Considerando uma expectativa de vida de 70 anos, tenho ainda pela frente aproximadamente 51 anos. E isso é um pouco mais de 2 vezes e meia o que eu já vivi. 51 anos, apesar de ser bastante tempo, ainda é menos tempo do que infinito. E isso é absolutamente assustador.
Assustador não só pelo fato em si, mas também porque eu sei que conforme o tempo passar, a perspectiva de ficar mais velho vai ser mais e mais presente. Uma das coisas que me fez ter esse pensamento foi algo que o Luis Fernando Veríssimo disse em uma entrevista, quando lhe perguntaram o que ele esperava da vida: “Nessa altura da vida, a única coisa que eu espero da vida, é mais um pouco de vida!”.
E ele ainda é uma criança perto do Niemeyer, recentemente falecido aos 104 anos.
Imaginem por um momento o que é viver até os 104 anos. Agora imaginem o que é ter 104 anos. Se alguém com 104 anos parar pra pensar o que eu pensei, pensaria algo assim “Considerando uma expectativa de vida de 70 anos, eu estou 34 anos atrasado”. Qual será a quantidade de arrependimentos que uma pessoa de 104 anos tem? Quantas coisas ela gostaria de ter feito mas não fez? Qual é a sensação de estar ficando sem tempo?

É claro que envelhecer talvez não seja algo absolutamente negativo. Afinal, conforme envelhecemos as lembranças passam a ser companheiras, e o passado nos ocupa a mente mais do que o futuro ocupava antes; afinal, a morte não chama tanto a atenção quando temos tantas lembranças bonitas com as quais nos ocupar.
As páginas em branco perdem a importância quando temos tantas páginas escritas.

O que se pode concluir disso é aquilo que todos concluimos sempre, e que muitas vezes já foi concluído antes, e que ainda muitas vezes será concluido até o fim dos tempos, enquanto houver algum ser humano para filosofar sobre a condição humana: não há tempo a perder para ser feliz, e nunca é tarde para tentar. Imaginem se, na idade do Luis Fernando Veríssimo, as pessoas se deprimirem e se esconderem, como os cachorros, para morrer, e aí vivem até os 104 anos como o Niemeyer. Elas terão passado um terço de suas vidas deliberadamente evitando a felicidade. Mesmo velho, tu nunca sabe com certeza que não dá tempo de ser muito feliz mais uma vez.
Se o fígado não aguentar mais o tranco, convida os amigos e toma um copo de leite! Se embriaga com chá de camomila! Se o corpo não aguenta mais um futebolzinho, reúne os amigos e sei lá, joga gamão...
A mesma incerteza que pode nos assustar, é o que nos protege da sensação de irreversibilidade, é o que abre precedente para a esperança de mais um dia.

Espero descobrir um dia como é ter 104 anos. E 110, 120! Mas também espero que esse tempo demore a passar; e que quando passe, que as minhas lembranças sejam o meu livro de cabeceira.

Boas meditações e boas festas!