quinta-feira, 18 de março de 2010

Inspiração Lunática

Muitos nascerão e muitos morrerão antes que se descubra tudo que há para se descobrir a respeito da inspiração. De onde vem, pra onde vai, o que fazer para que ela nos sorria quando olhamos em sua direção pedindo, suplicando, mendigando idéias... Por que é triste ter a vontade, mas não ter uma idéia em cima da qual trabalhar.
A lua, por exemplo. Quantas pessoas já escreveram a seu respeito? Quero dizer, ela deve ter alguma coisa mágica, pois de tudo já foi falado a seu respeito. Mundo de queijo, paraíso dos ratos; parceira dos enamorados (nos romances água com açúcar em que pesaram a mão no açúcar); arquiinimiga dos lobisomens, ou pelo menos era, até antes da Stephenie Meyer vampirizar com as histórias de vampiros e lobisomens, com essas histórias tão divulgadas e supervalorizadas que circulam pelos adolescentes. Sim, há uma referência a lobisomens “de verdade”, em alguma parte do quarto livro, só que isso não redime de forma nenhuma o que essa monstra fez com o Drácula.
Como eu dizia, a lua deve ter algo de mágico. Basta pegar uma cadeira e se sentar em uma noite de céu limpo e lua visível para se ter uma experiência religiosa contemplando o astro mais brilhante do firmamento noturno. O fato de que não tem luz própria, e que depende do sol para que o vejamos, é só uma de suas infinitas possibilidades de filosofar, pensando a respeito de ser dependente, de não ter “luz” própria, de estar sempre eclipsado por outra pessoa...
Eu é que não caio nessa. Sou como um drogado que está tentando se recolocar na sociedade, então tento não provar muito do meu vício, que é o pensamento maionesístico. Divertido, dá até um barato... mas hoje não.
O que me proponho é algo mais leve. A minha metadona, se me permitem dizer assim. Algo meio científico, por que disso não me privo, nem quero me privar, mas ainda assim com um pé na realidade.
Pois bem. Girando a uma distância de aproximadamente quatrocentos mil quilômetros da Terra, esse pedaço de pedra pesando 73 sextilhões de quilos tem a audácia de nunca nos mostrar a bunda. O seu período de rotação é igual ao de translação, ou seja, a face que vemos da lua é sempre a mesma. O que teria do outro lado da lua é uma questão interessante e fecunda.
Estaria lá o Papai Noel lendo as cartinhas das crianças famintas da África? (ponto para quem disse que o lado científico da coisa e a minha promessa de me manter longe da maionese terminaram no parágrafo anterior) Ou o Coelhinho da Páscoa, fabricando ovos? Os chineses (ou os japoneses, mas isso tampouco importa) acreditam (não que todos acreditem; com isso quero dizer que isso é uma crença tradicional de lá. Até porque, caso se tratar dos chineses, há um bocado deles pelo mundo, muito chinês meeeesmo, e seria bobice achar que todos acreditariam na mesma mentira, mesmo que às vezes aconteça) que na Lua estão vários coelhinhos fazendo bolinhos de arroz. Posso imaginar, contudo, que a imagem verdadeira hoje seria a seguinte: o Coelhinho da Páscoa, há muito vampirizado (não como os lobisomens) pelo capitalismo e consumismo desenfreado (ver EUA, em qualquer enciclopédia), desenvolveu um gosto excessivo pelo dinheiro, esquecendo mesmo do sexo com a Coelhinha da Páscoa, que morreu de desgosto. Vendo que não conseguiria produzir sozinho o que a demanda pedia de ovos de chocolate, ele hoje explora o trabalho dos coelhos chineses, obrigando-os a fabricar seus ovos de chocolate ao invés dos bolinhos de arroz que há tanto produziam. Dizem que ele planeja alcançar o público adulto, nas próximas páscoas, desenvolvendo mais a idéia dos licores de chocolate, uma mistura exótica com o saquê feito com o arroz excedente (tipo, pararam de fazer bolinhos; alguma coisa tem que ser feita com todo aquele arroz) que deixaria meio mundo bêbado. O Papai Noel faria parte do setor de qualidade, estando portanto impossibilitado de dirigir seu trenó.
Talvez, em uma visão menos pascal-imperialista da coisa, no lado escuro da lua exista uma cidade de seres lunáticos que desconhecemos. Os moonies. Grandes prédios, carros voadores, portas giratórias, tudo muitíssimo bonito, em aço inox ou em algum tom de branco. A cidade seria pequena em questão de largura, mas ela poderia muito bem entrar Lua adentro, em um complexo sistema de cidade subterrânea. Tudo isso seria ainda mais impressionante por que os moonies, grandes moonies, tem só uma perna saindo de um corpo peludo e fofo, do qual um olho (apenas um), sempre com um olhar melancólico e pidão (ver Gato do Shrek, não confundir com Gato de Schroedinger), perscruta o ambiente em busca de uma criança que possa afagar os seus pelos macios e sedosos. Eles nunca acham, e esse é o porquê do olhar melancólico. Como eles construíram tudo aquilo é a pergunta chave para entender por que isso tudo seria impressionante.
Existe ainda a possibilidade de existir, bem no meio do outro lado da lua (assumindo, é claro, que esse outro lado exista), um senhor grisalho, barbudo, olhar profundo de Eu-Sei-Tudo-E-Entendo-A-Sua-Inquietude, túnica branca como a lua, apoiado em um cajado de madeira e sentado em cima de um baú onde, como imediatamente se percebe, estão trancados todos os Segredos e Respostas. Onde está a ilha de Lost? Onde está o padre dos balões? Onde está aquela menina desaparecida? Onde está Wally? O velhinho sabe. Seu nome (o do velhinho) é Arnoldo, e quando questionado sobre como respira se na Lua não tem atmosfera ele só sorri e balança a cabeça, como fazem as pessoas que não escutam muito bem.

De todos os mistérios trancafiados no baú do velhinho, ou no cofre dos arquivos empresariais do Coelho, ou na mente dos moonies, um que nunca terá resposta, ou que terá mas que muitos nascerão e muitos morrerão antes de descobri-la, é sobre a inspiração. Não dá, ela é um Grande Mistério. De onde vem, para onde vai...

Só sei que falar da lua funciona.